Em Junho de 1940, e ao arrepio das ordens recebidas, o cônsul português, em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes, emitiu milhares de vistos permitindo a fuga para a liberdade a muitos que fugiam ao nazismo.Para honrar esta acção e relembrar o papel crucial que Portugal desempenhou no acolhimento aos refugiados durante a II Guerra Mundial, a Câmara Municipal de Almeida está a construir o pólo museológico, VILAR FORMOSO – FRONTEIRA DA PAZ, MEMORIAL AOS REFUGIADOS E AO CÔNSUL ARISTIDES DE SOUSA MENDES.
Através de seis núcleos distintos, Gente como Nós, O Início do Pesadelo, A Viagem, Vilar Formoso – Fronteira da Paz, Por Terras de Portugal e A Partida, o visitante poderá « vestir a pele » de um refugiado no percurso até à Liberdade.
Este Pólo Museológico que se integra no projecto da Rede das Judiarias de Portugal, está a ser erigido a partir de dois armazéns existentes, alvo de um contrato, por 20 anos, entre a C.M. de Almeida e a IP Património. Estes armazéns localizam-se na Estação de Caminhos de Ferro de Vilar Formoso, definindo o limite Sul/Sudoeste do Largo da Estação.
Conceito Geral do Pólo Museológico – Do Espaço Expositivo
O espaço expositivo irá transmitir, “quase” fisicamente, a experiência destes refugiados europeus que, durante a IIª Guerra Mundial, tiveram como uma das poucas hipóteses de salvação, a fuga através de Portugal, aqui ficando, até à posterior partida para, maioritariamente, o novo continente. – A América.
O Novo Volume da Entrada
A Nascente, sobre a plataforma existente, será construído um Novo Volume que terá uma forma cúbica, com cerca de 4,50 m de lado e que se adossará ao Armazém Pequeno, a eixo com a fachada nascente deste. Este Volume fará as funções de espaço de Entrada /Recepção do novo Pólo Museológico/Memorial.
O Armazém Pequeno
O espaço expositivo começará, então, neste edifício que integrará os dois primeiros núcleos: o Núcleo 1 – Gente como Nós e o Núcleo 2 – O Inicio do Pesadelo.
A forma deste edifício propicia a concepção de um espaço que se desenvolve em comprimento (tipo corredor) assim criando um percurso contínuo que muito bem se adapta ao conteúdo expositivo proposto.
Núcleo 1- Gente como Nós
Este primeiro Núcleo vai apresentar a vivência da normalidade daqueles que eram “gente como nós” e que irão ver as suas vidas viradas do avesso, com a ascensão ao poder de Hitler, na Alemanha, em 1933.
Gente Como Nós
Egon Raiman e a sua mulher Grete passeando nos bosques de Viena, cerca de 1937.
Colecção particular Eva Cabral
Núcleo 2 – O Inicio do Pesadelo
No núcleo 2, o pesadelo em potência, já subjacente de uma forma subtil, no núcleo 1, vai concretizar-se.
O conteúdo expositivo irá apresentar, numa sequência cronológica, de 1933 a 1940, os acontecimentos mais importantes que obrigaram milhares de pessoas a fugir, a abandonarem as suas vidas, as suas casas, a separar-se de amigos e familiares, a romperam as suas vidas normais e a fugirem para o desconhecido.
A forma do espaço proposto é, então, o tal Corredor, de secção hexagonal variável, progressivamente decrescente, em que os diversos planos confluem num ponto de fuga imaginário, à altura do olho humano. O efeito de perspectiva forçada daí resultante vai criar um espaço que “suga e empurra para o fundo”..
A forma deste espaço relaciona-se ainda, simbolicamente, com a Estrela de David.
Inicio do Pesadelo
Placa proibindo a presença de judeus.
United States Holocaust Memorial Museum, cortesia de Hans Frankl
O Novo Volume da Viagem
Este novo volume, que irá unir os dois armazéns existentes, permitirá dar continuidade ao percurso expositivo correspondendo ao Núcleo 3 – A Viagem.
Este volume, que ficará quase como que suspenso inspira-se na forma e nas dimensões de um comboio, construindo um espaço viagem, dinâmico, onde o pavimento, as paredes e tecto se inclinam relativamente à horizontal e à vertical.
Pretende-se que a forma e o conteúdo comuniquem, ao visitante, as condições muito duras desta viagem, deste percurso de fuga, quase sempre uma verdadeira prova de obstáculos em que as filas à porta dos consulados, para obtenção de vistos, a falta de alojamento, de comida e de transportes seriam, apenas alguns dos contratempos com que se teriam de debater. Felizmente para muitos, Aristides de Sousa Mendes esteve nesse caminho de fuga.
A Viagem
Refugiados em Bordéus, Junho de 1940.
Colecção particular Anna Katharina Stillisch
O Armazém Grande
Os núcleos 4,5 e 6 ir-se-ão implantar no Armazém Grande que já existia ao tempo da IIª Guerra Mundial.
Este armazém propiciará a criação de um espaço que irá construir um contraponto intencional aos espaços dos núcleos anteriores: a ideia de Expansão e de Abertura, em contraponto à ideia de Compressão e Fecho anterior; de Luz e de Comunicação com o Exterior/Exteriores, em contraponto à predominância da Escuridão e Oclusão anterior; de Múltiplos Caminhos possíveis em vez de um Único Percurso de Fuga; de um Espaço que Acolhe e propícia uma Pausa, em contraponto a um Espaço que Empurra, de um Andar Sem Descanso.
Núcleo 4 – Vilar Formoso / Fronteira da Paz
O primeiro espaço que acolhe em Portugal – Vilar Formoso – a principal fronteira de entrada em Portugal para quem vinha de comboio ou de carro.
Na antecâmara, no espaço de entrada no Armazém Grande, a receber-nos – o Azul: o Azul da Placa de Azulejos que dá a certeza do grande objectivo conseguido – “ Vilar Formoso – Portugal”, o Azul de um Céu sem guerra e sem perigo, o Azul das pessoas calorosas que receberam os refugiados, …
Aqui, no percurso expositivo duas hipóteses se colocam – vêem-se duas entradas – uma mais ampla e franca e outra mais escondida. Experimentemos a segunda.
O Comboio Maldito
A história do denominado Comboio Maldito – o comboio com cerca de 300 Judeus Luxemburgueses a quem foi negada a entrada em Portugal, em Novembro de 1940.
Estes refugiados ficaram retidos durante cerca de uma semana num comboio estacionado na Estação de Vilar Formoso à espera… do veredicto.
Vilar Formoso /Fronteira da Paz
A outra entrada, franca, é que nos vai dar acesso ao espaço, de paredes curvas e geometria de base circular, que nos vai contar a chegada dos refugiados para quem Vilar Formoso foi a Fronteira da Paz.
Vilar Formoso Fronteira da Paz
Fila de carros na fronteira de Vilar Formoso no final de Junho de 1940 – Frame retirado do filme “Refugiados Estrangeiros em Portugal” de George Rony, 1940.
Copyright © 1940 George Rony. All rights reserved. Reproduced with permission from the Estate of George Rony
Núcleo 5 – Por Terras de Portugal
Depois de cumprirem todas as formalidades para entrarem em Portugal / Vilar Formoso, e devido a um afluxo crescente, a maioria dos refugiados eram encaminhados para estâncias balneares e termais, onde ficavam em residência fixa. A linha de caminho-de-ferro da Beira Alta foi um dos principais meios de transporte para o escoamento e distribuição dos refugiados Por Terras de Portugal.
Assim, a partir do núcleo de Vilar Formoso, abrem-se vários percursos (expositivos): um percurso/corredor directo para Lisboa e outros para os outros subespaços que irão representar os principais locais de residência fixa em Portugal: Duas cidades: Porto e Coimbra, as estâncias termais: Luso/Buçaco e Curia e Caldas da Rainha e as estâncias balneares: Figueira da Foz, Ericeira e Praia das Maças/Azenhas do Mar, Estoril/ Cascais e outras localidades, perto de Lisboa, como Sintra e Lousa de Cima.
Por Terras de Portugal
Figueira da Foz, Rua Cândido dos Reis (Picadeiro), Anos de 1940.
Arquivo Fotográfico Municipal da Figueira da Foz
Núcleo 6 – A Partida
O núcleo da Partida será uma parede recta que se destaca e se autonomiza, a partir da parede curva do núcleo de Lisboa. Era daqui que se partia para o Novo Mundo ou de barco, a partir do Porto de Lisboa (normalmente da Doca Rocha Conde de Óbidos) ou de hidroavião/clipper, a partir da Estação Marítima de Cabo Ruivo ou/e, mais tarde, com a abertura do Aeroporto da Portela, de avião.
A Partida
Partida do Nyassa para o “Novo Mundo”.
Colecção particular Anna Katharina Stillisch
Do lado exterior da parede da Partida, que corresponde ao espaço Loja e Saber Mais, existirá uma parede Obrigada Portugal onde se fará uma composição com algumas frases de agradecimento dos refugiados a Portugal e aos Portugueses pelo seu acolhimento nesses dias conturbados da IIª Guerra Mundial.
Do Exterior:
Será criado um “bosque de carvalhos”, na área do actual logradouro, a norte do Armazém Grande, que se constituirá como espaço exterior de saída do Pólo Museológico e que será um jardim percorrível Propomos a designação de Jardim da Memória.
Ficha Técnica
Promoção
Município de Almeida
Coordenação Geral do Projecto e Projectode Arquitectura
Luísa Pacheco Marques, Arquitecta — SociedadeUnipessoal, Lda.
com a participação de:
Luísa Pacheco Marques, Arquitecta (coordenaçãogeral e autoria)
e dos seguintescolaboradores:
Milena Raposo, Arquitecta
João Gomes, Arquitecto
Comissariado
Margarida de Magalhães Ramalho, Historiadora
DesignGráfico
Filipa Pias
Projectode ArquitecturaPaisagista
Luís Cabral, ArquitectoPaisagista, Arpas – ArquitectosPaisagistas Lda
InstalaçõesTécnicas
Prom&E Group – Building Solutions (coordenação)
PMP – Consultoresde Engenharia, Lda.
ECWS – Engineer and Consulting, Lda.