Homenagem a Maria Adélia
Maria Adélia dos Santos Ferreira Sousa nasceu a 29 de janeiro de 1942 em São Pedro do Rio Seco, no concelho de Almeida, e faleceu a 21 de outubro de 2021.
Frequentou a escola primária na sua aldeia natal, prosseguindo os estudos secundários no Liceu Nacional da Guarda. A morte do seu pai e as dificuldades financeiras da família, inerentes aos escassos recursos económicos da região, forçaram-na a abandonar o liceu e a ingressar no Magistério Primário.
Desde muito cedo, começou a pisar palcos, a cantar e a declamar poesia. Fez parte do Orfeão do Liceu Nacional da Guarda e representou inúmeras vezes o Magistério Primário, recitando poemas do Pe. Moreira das Neves, de Guerra Junqueiro e de tantos outros.
Nas férias voltava à sua terra natal para fazer uma outra aprendizagem: a da labuta dos campos, ajudando os seus pais de sol a sol.
Em julho de 1961, terminou o Magistério Primário. Trabalhou durante 9 anos no concelho de Monção e 25, no concelho de Almeida.
Já aposentada, continuou a trabalhar no campo e a cuidar de muitas cabeças de gado, escrevendo, ao mesmo tempo, poesia. Pela noite fora, lê… Os livros e a vontade de saber mais sempre foram a sua grande paixão. O campo nunca lhe impediu a leitura que, há uns anos, nestas regiões, era feita à luz trémula da torcida da candeia ou do candeeiro de petróleo.
Em 1996, é publicado o seu primeiro livro de poemas, Ruminante: poesia, uma edição da autora, concebido durante pouco mais de um ano, de junho de 1994 a outubro de 1995. Como refere Deolinda Filomena Monteiro, no prefácio da obra, é um livro «que nos coloca perante algumas das grandes interrogações humanas e universais, em que cada poema funciona como o lugar de encontro entre o “eu” solitário que escreve e o que lendo, sente» (Ruminante: poesia, p.7), existindo assim uma grande interrogação sobre vários problemas da existência humana: o saber; a dor; o sofrimento; a fome; o sonho; o poder; a falta de cultura.
Além de recordar memórias passadas, Maria Adélia escrevia sobre os afazeres rurais a que se dedicava, e «escreve, escreve sem parar num perpétuo ruminar de ideias e emoções, mostrando os vários tempos, transmutando-os, convertendo-os num perfeito ritmo de sentidos, em que a vida passa a ter essa alternância do repicar de um sino: “O sino é mesmo assim/ Comanda nosso coração/ Põe-no alegre com o d’lim/ Põe-no triste com o d’lão…”» (id. – ib., p. 8).
A musicalidade da sua poesia é extremamente forte, evocando e convocando imagens e palavras que a transportam para uma hermenêutica da razão, à luz de uma moral ética com que escrevia os seus poemas… e escrevia por necessidade de ter a pena como companheira e a memória como vida: “A alegria do poeta/ É etérea/ É diferente/ Tal e qual/ Como a que sinto/ Ao poder/ Por este meio/ Na ausência/ Estar presente!…” (Dedicatória escrita num dos exemplares existentes na biblioteca, do dia 27 de janeiro de 2010).