OS JUDEUS SECRETOS E A ESNOGA DE MALHADA SORDA
A vinda dos Judeus para terras de Ribacoa é anterior ao Tratado de Alcanises (1297), que integrou em Portugal esta região. Das povoações que na idade média ali tiveram judiaria, evidencia-se Castelo Rodrigo, cujo Rabi intervinha juridicamente nos pleitos dos judeus. O rei de Leão, D. Afonso IX, regulamentou as relações entre judeus e cristãos e, em 1209, outorgou foral à Vila.Depois da conversão forçada dos judeus, a Esnoga, ou Sinagoga, de Castelo Rodrigo foi transformada no Séc. XVI em cisterna, a partir da Mikwé, o local do banho ritual das judias.
Em Almeida, Pinhel, Castelo Mendo, Castelo Bom, V.N. de Foz Coa, Vermiosa, Sabugal e Alfaiates, quando pertenceram ao reino de Leão, já nelas viviam hebreus. Continuaram ao serem integrados no Reino de Portugal.
Do lado de lá da fronteira, S. Felices do los Gallegos, AldeadelObispo, Fuenteguinaldo e Ciudad Rodrigo, também tinham judiarias. Depois de expulsosos judeus de Espanha, os Reis Católicos, por carta de 27 de Maio de 1492, doaram a ampla Sinagoga de Ciudad Rodrigo ao Cabido para construção de uma Igreja e Hospital ( Iglésia de San Agustín e Hospital de la Pasión). O édito da expulsão foi assinado em 31 de Março de 1492, depois da conquista de Granada, quando ocuparam o Palácio da Alhambra. Curiosamente a data da expulsão coincide, historicamente, com o dia e mês da destruição do Templo de Jerusalém.
Segundo a cronica do Cura de Los Palácios, saíram de Cidade Rodrigo para Portugal 35000 judeus, que entraram pela raia seca de Almeida. Espalharam-se por terras de Ribacoa e vizinhas, preferindo aquelas onde já havia judeus. Guarda, Trancoso e Celorico da Beira foram as que acolheram mais.
Três vezes esta região recebeu refugiados hebreus. A primeira nos tempos da reconquista e repovoamento, fugindo aos mouros. Depois deixando Castela para evitarem a vingança de D. Henrique de Trastâmara, por terem ajudado o legitimo Rei D. Pedro I na guerra civil. A última, expulsos pelos Reis Católicos em 1492 e acolhidos por D. João II. Três anos depois sucedeu-lhe o primo D. Manuel I (1495/1521). Por acordo nupcial com a Princesa Isabel, filha dos Reis Católicos, comprometeu-se a expulsar de Portugal os judeus. Em 5 de Dezembro de 1496, por decreto, ordenou a saída de Portugal de todos os judeus num prazo de 10 meses. Deu-lhes como alternativa converterem-se ao Catolicismo. Os convertidos foram descriminados com o nome de Cristãos-Novos e pejorativamente com o de marranos, palavra que significa porco ou suíno. Esta descriminação nega o universalismo da Igreja. Os conversos, secretamente, continuaram a judaizar. D. João III fez tudo para introduzir a Inquisição em Portugal, à semelhança da Espanha. O Papa autorizou-a pela Bula Meditatio Concordia de 16 de julho de 1547. Manteve-se esta criminosa prática, com prisões e mortes na fogueira até 1821, data em que foi extinta graças à Revolução Liberal de 1820.
A conversão forçada gerou o Criptojudaísmo e denúncias verdadeiras e falsas. Esta perseguição levou a que tivessem Sinagogas secretas.
A C. M. Almeida, graças ao empenhamento do seu dinâmico Presidente, Prof. Baptista Ribeiro, recuperou em Malhada Sorda, freguesia daquele Concelho, um edifício arruinado, que foi Esnoga, ou Sinagoga.
O nome Malhada Sorda não é vulgar. Liga-se historicamente à transumância, que se fez activamente na pré-história e idade média e subsiste limitada.
Malhada significa redil, curral, lugar da recolha do gado. Sorda, cabana. Este vocábulo mantem-se no Castelhano. Testemunhando a transumância e a passagem do gado, situa-se próximo a povoação de Porto de Ovelha.
Em Hebraico Sinagoga é Bet-Há-Knesset, a Casa da Assembleia. Tem significado diferente de Igreja, a Casa de Deus.
Na Malhada Sorda o edifício conhecido por Esnoga, apresenta o aspecto de uma casa de habitação, não despertando suspeitas aos inquisidores. Na fachada rasga-se uma janela em estilo manuelino tardio do Séc. XVI. Quando o edifício foi erguido já tinha sido determinada a expulsão ou conversão forçada. Não se construíam Sinagogas. Numa esquina da casa colocaram no remate um relógio de Sol, provavelmente no Séc. XVII.
O edifício tem porta de entrada no primeiro andar, com escadas exteriores e no rés-do-chão uma ampla loja. No ombral direito da porta de entrada não há vestígios da implantação da Mezuzah, sinal de santificação e bênção da casa, evocando o nome de Deus. No interior tem o aspecto de uma casa de habitação e para maior dissuasão dos inquisidores há numa parede uma pia de água benta encimada por uma cruz. O armário da parede não pode ser identificado com o aronhakodech ,para guardar os rolos sagrados, nem está voltado para oriente. Secretamente o espaço podia ser adaptado para nele celebrar o culto.
Adriano Vasco Rodrigues